domingo, abril 25, 2010

Espelho, espelho meu, quem é o mais bem-sucedido?

Caderno: EU&Carreira - Pág. D-10

Banda executiva:

Espelho, espelho meu, quem é o mais bem-sucedido?

Lucy Kellaway

05/04/2010

No começo de seu novo livro, Maria Bartiromo, a jornalista financeira americana e

âncora de TV, descreve-se encarando sua imagem no espelho e perguntando:

"Maria, você é um sucesso?". A resposta é bem longa e preenche 293 páginas nas

quais a Money Honey (como ela é conhecida) faz considerações sobre sua própria

vida e a de pessoas famosas que ela já entrevistou, resultando em "The 10 Laws of

Enduring Success" (As 10 Leis do Sucesso Eterno).

Tentei fazer a mesma coisa na semana passada e me encarei no espelho, enquanto

escovava os dentes. "Lucy, você é um sucesso?", perguntei. Foi difícil me

concentrar na pergunta, uma vez que meus olhos insistiam em se desviar para as

raízes dos meus cabelos e eu imaginava quanto tempo conseguirei resistir antes de

visitar o cabeleireiro novamente. Mas consegui chegar a alguns pontos simples.

Para começar, essa não é uma boa pergunta. Você não deveria ficar se

perguntando se é um sucesso, e sim se você está feliz ou se sua vida tem algum

significado. Se a resposta for não, aí sim você poderá se sentir mal. Mas se for sim,

então isso será complacente e arrogante e provavelmente significará que logo você

estará arruinado. Nas poucas vezes na vida em que me senti bem sucedida, eu

comemorei estragando quase tudo ao mesmo tempo.

As pessoas realmente bem sucedidas que conheci demonstram o absurdo dessa

pergunta. Elas sentem-se bem sucedidas e paranoicas ao mesmo tempo. Vivem

com um medo mortal de perder esse sucesso, ou num estado torturante de

insatisfação, querendo sempre mais. Então, me lembrei dessas pessoas e fiquei

imaginando quais seriam suas leis do sucesso eterno. Antes mesmo de terminar de

escovar os dentes eu concluí minha lista - que tem apenas dois itens.

O primeiro, e o mais importante, é a sorte - e mesmo assim ela nunca é tema de

livros. Você precisa ser tão loucamente bem-sucedido quanto Warren Buffett para

admitir que a maior coisa que ele fez foi ter nascido branco e homem nos EUA na

época em que nasceu. As pessoas mais bem-sucedidas tiveram um grande

momento de sorte ao nascerem e uma sucessão de pequenos momentos de sorte

daí em diante.

A segunda lei é a ambição. Todo mundo que conheço e que é bem sucedido nos

negócios realmente queria muito o sucesso que tem. A partir desse desejo louco,

quase tudo mais que você precisa acaba fluindo - trabalho duro, indiferença e um

caráter impiedoso. Caso contrário, consigo pensar em apenas mais uma coisa

indispensável para o sucesso: uma boa aparência. Se você é um empresário anglosaxão,

tudo bem ser (razoavelmente) feio. Mas se, assim como Money Honey, você

é mulher e quiser seguir carreira na televisão, a beleza é fundamental.

Portanto, é isso. Minhas duas leis e meia para o sucesso duradouro. Maria

evidentemente é mais ambiciosa do que eu e desse modo trabalhou mais para

surgir com as dez leis, mas algumas delas são totalmente equivocadas.

A primeira lei de Maria é o autoconhecimento. No que ela estava pensando? As

pessoas que têm muito autoconhecimento entendem suas fragilidades e isso as

desqualifica de terem a confiança necessária para serem bem sucedidas. Depois,

ela afirma que a integridade é essencial. Seria bom se fosse, mas está claro que

não é. E o mais embaraçoso de tudo é ela afirmar que é vital ter humildade. Se

você vive no Reino Unido, entendo que é bom fingir ser humilde, uma vez que nós

britânicos gostamos de nos autodepreciar. Caso contrário, a humildade é um

desastre. Em todo caso, não é uma lei que Money Honey se envolve muito. Na capa

de seu livro, as palavras "Maria Bartiromo" aparecem em corpo bem grande e com

destaque. O nome do "ghostwriter" (estou muito impressionada que uma jornalista

tenha um) aparecem em fonte simples e tamanho bem pequeno.

Há uma coisa que não aparece nas minhas duas leis e meia, nem nas dez de Maria:

habilidade. Não a deixei de fora por não ser importante, e sim porque é uma coisa

muito comum. Há muito mais pessoas habilidosas no topo do que o contrário.

Enquanto escrevo isso, penso em mais uma lei do sucesso: saber dizer coisas

óbvias e fazer as pessoas pensarem que você disse algo inteligente. Todas as

pessoas mais experientes das empresas fazem isso sem esforço todos os dias. É

claro que o que eu disse sobre sorte e ambição é ridiculamente óbvio. Mas se você

achar inteligente, eu poderei ir para o cabeleireiro me sentindo um sucesso total.

Lucy Kellaway é colunista do "Financial Times". Sua coluna é publicada às

segundas-feiras na editoria de Carreira

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